quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Com os olhos na janela

Antes de mudarmos para os EUA, tivemos um longo trabalho de convencimento com nossos filhos, principalmente com o Lucas, nosso filho do meio. O grande ponto que o atraiu para essa longa e importante mudança foi a neve. "Vou morar em um lugar que tem neve, vó!" . Dizia ele sempre muito animado.

Mas chegamos em pleno verão, e assim que aterrissamos em Nova Iorque, o Lucas queria saber onde estava a neve. Outro longo trabalho de convencimento se iniciou, tivemos conversas diárias explicando quando e como cairia a neve. Passei a usar os sinais da natureza para materializar as mudanças das estações e as árvores me ajudaram muito neste trabalho. Percebia que estava dando certo quando o Lucas, muito atento, retomava nossas conversas dizendo: "As folhas estão mudando de cor e logo elas vão cair. Aí vem a neve, né mãe?!". 

Passamos também a usar a neve como parâmetro para as tão esperadas visitas: "Antes da neve ninguém vem, mas quando a neve acabar, o vovô, a vovó, o Arthur e os titios vão chegar!". E todo santo dia essa criança do meio repetia as mesmas afirmações, confirmando para seu euzinho interior que logo logo a saudade vai dar lugar para o encontro e a alegria em rever sua família que ficou no Brasil.

Aconteceu que o aplicativo do clima lançou a previsão de neve para o primeiro domingo de novembro. Alegria geral na nossa casa! Uma enorme expectativa para ver esse fenômeno branquinho e gelado que até então, só fazia parte dos nossos repertórios de filmes e histórias de livros. Eu nunca vi a neve e esperei com muita ansiedade, até mais que as crianças - eu acho! Só que no meio da semana a previsão muda: só chuva! Nada mais de neve! Nos jogaram um balde de água fria!!!! O Halloween desviou um pouco nossa atenção e seguimos animados com os doces recolhidos na sexta-feira de bruxas! Eis que a previsão volta a apontar a neve e já era domingo: "Lucas, a neve vai chegar, meu filho!".

Com os olhos na janela, amanhecemos ansiosos para ver os primeiros flocos a cair. E nada... era chuva e muito frio as únicas coisas que víamos pelo vidro. Várias mensagens começaram a chegar pelo celular: "neve! neve! tá caindo". Mas onde, puxa vida, que a gente não vê porcaria nenhuma? As crianças desanimaram, tiraram os olhos da janela e passaram para a televisão. Eu via alguma coisa branca caindo, mas era chuva e não neve. Não perdi a esperança: "venham ver gente, agora tá caindo!". De janela em janela, eu buscava o melhor ângulo para enxergar: "subam, venham ver na janela aqui de cima, agora é neve gente!". 
Foi então, que lá do céu, algo misterioso e muito piedoso ("vamos dar mais alegria para essa família!") mandou ligar uma máquina de neve aqui em nosso quintal. E ela veio, linda, branquinha, silenciosa, gelada, fantástica e mágica como nos filmes e nas histórias dos livros. Era a neve! 

"Corre pra fora que vai ser rápido", disse a amiga Duda por mensagem pelo celular. Botei os casacos e as botas e saímos de pijama mesmo para o quintal. Sentimos no corpo o milagre da natureza! Que lindo! Que coisa incrível é a neve! Sei que para quem vive esse fenômeno sempre e por muito tempo, nem acha isso tão incrível assim. Sei que vamos ter neve até enjoar e que eu posso escrever aqui, daqui alguns meses, "to cansada de ver neve!". Mas nada disso tira o encanto desse primeiro contato!

O Brasil é lindo, tem um clima agradável e nós temos sol e calor. Mas eles têm a neve, que é mágica (como disse minha amiga Mariana)! 

Com os olhos na janela, vimos o gramado ficar branquinho, o tronco da nossa árvore também ficou; as bicicletas, os carros... e assim ela seguiu caindo e deixando nossa manhã do primeiro domingo de novembro mais feliz.
Caiu e depois parou!

E lá vem o Lucas com suas observações: "Eu fico feliz que tem neve, não pode parar! E se agora a neve acabou, minha vó ta chegando!". Hahahaha! Outra vez, muita conversa para explicar o que mais está por vir.

De sol em sol, de neve em neve, a cada dia que passa descobrimos coisas novas e construímos,  sempre, um jeito novo de ser.