quinta-feira, 4 de setembro de 2014

O primeiro dia de aula



Era para ser apenas o primeiro dia de aula dele. Nem tão simples assim! Era o primeiro dia de aula dele em uma escola americana em que todos falam uma língua que ele começou a conhecer agora. Meu filho tem apenas 7 anos e está voltando de férias para a turma do segundo ano em uma escola nos EUA.

  Era para ser apenas o primeiro dia de aula! Nós nos esforçamos para deixa-lo tranquilo e seguro, para que dessa forma pudesse encarar o desafio de frente. Apenas tentamos.. 
Eu, que sou mãe de 3 filhos, já passei pela situação de deixar meu bebê na escola várias vezes. Nunca dói como na primeira vez, que só dói mais porque é uma situação desconhecida (como o primeiro parto e tantas outras primeiras vezes..). Mas juro, que o que eu senti hoje foi algo muito parecido quando deixei o João pela primeira vez na creche.
Ele era um bebê fofinho com os olhos puxadinhos. Sempre que chegava na creche eu o confundia com uma bebezinha oriental! Era o João, que chorou uma semana inteira na adaptação e eu só fui saber disso no final do ano quando recebi um cd com fotos dos seus momentos na creche com os amigos. Eu também chorei quando virei as costas e deixei meu filho no colo de uma pessoa desconhecida que ele nunca havia visto na vida (nem eu!), mas vida de mulher que trabalha tem essas coisas e eu escolhi essa vida pra mim.
Ele já está com 7 anos e caminha com sua mochila nas costas rumo à experiência mais louca da sua vida, experiência esta escolhida pelos seus pais: estudar numa escola onde ninguém fala português e ele mal consegue entender o que os outros falam. Mas o João entrou de cabeça erguida, olhos atentos, sorriso amarelo e mil caraminholas na cabeça! Como eu queria ler seus pensamentos nessa hora!
Eu tentei armar uma barreira nos olhos para conter as lágrimas, para mostrar força e coragem, só que por dentro havia uma mistura de sentimentos: a felicidade ao ver aquela escola de filmes que eu sempre sonhei na minha infância, toda organizada e incrível; uma escola pública! Mas eu também senti medo que ele ficasse sozinho, pois quando não compartilhamos a mesma língua, nos sentimos excluídos (com a comunidade surda, deve ser assim!). 
Entramos na sala, a professora vem até nós e quando eu poderia usar a única frase que eu sei em inglês (nice to meet you!), eu estava tão emocionada que não saiu nada, só um monte de lágrimas esbarradas no muro que eu construí. Ele colocou sua mochila no cabide e organizou seu material na carteira. Sentado, com aquele sorriso mais lindo no rosto, João se despediu da gente. Será que eu não poderia ficar mais um pouco? Tem cadeira sobrando? E se ele precisar ir no banheiro e não conseguir falar? E se alguém fizer alguma maldade, ele não vai saber contar!? Ainda bem que eu não falo inglês e essas perguntas bestas ficaram dentro dessa minha cabeça de mãe!
Difícil foi fazer o Lucas e a Helena entenderem que o irmão fica e eles vão.. Ela saiu pela casa várias vezes procurando o João e o Lucas ficou de olho no relógio aguardando a hora de sair de casa para buscá-lo. E eu, fiquei vazia por dentro, imaginando meu pequeno grande filho, sentado naquela mesinha sem entender bulhufas! 
Ainda bem que as horas passaram voando e logo estávamos prontos, junto com uma multidão de famílias que aguardavam ansiosos seus filhos retornarem.
Era só pra ser o primeiro dia de aula. E faltava apenas 5 minutos para a saída do João e foi ali que o tempo parou. E se o menino não saísse? Como eu faria pra encontrá-lo? Como eu perguntaria para as pessoas? Que droga não falar essa língua desse povo! E que monte de pensamento besta! Era óbvio que ele sairia feliz, com aquele sorriso lindo na cara, correndo e falando MÃEEEEE!
As portas se abriram no horário exato, mas só que duas portas se abriram. Puxa, ele pode sair ou por uma ou pela outra. Fiquei num lugar estratégico, onde eu podia ver a saída das duas portas. Muita criança! Muitos adultos! Muitos irmãos pequenos! Toda essa gente misturada esperando a saída da escola. Olho uma porta e nada! Olho na outra porta, e nada do João. Tudo bem, vamos ficar calmos, não para de sair criança desse lugar e meu filho entrou, vai ter que sair. 
Vejo que aquela multidão vai diminuindo, as famílias retornam felizes para suas casas e.. MEU DEUS, ONDE ESTÁ O JOÃO! Meu corpo ficou gelado, senti um desespero tomar conta dos meus pensamentos e pensei tudo que há de pior no mundo. Mandei uma mensagem para meu marido: O JOAO NAO SAIU! NAO ACHO O JOAO! Noto que algumas crianças estavam com professoras que seguravam um papel, olho em volta e não havia mais nenhuma família naquela porta de saída. Peguei o carrinho e as crianças e fui em direção às salas de aulas que nem uma leoa furiosa e, se precisasse eu falaria inglês pra achar meu filho!
Eis que ele aponta na porta, de mãos dadas com a professora e o rosto branco de nervoso: “Mãe, você precisa me pegar lá dentro!”, como assim???? E a professora me explica com um inglês perfeito de se entender, que ela havia dito ao meu marido que a saída da turma do João é “indoor” e não “outdoor”. Poxa vida marido, você que fala inglês não entendeu essa informação essencial para que esse fosse apenas.. O PRIMEIRO DIA DE AULA! Com certeza a emoção não toma conta só das mães nessa hora, com certeza ele estava tão aflito quanto eu que nem entendeu direito como seria a saída da turma.
Depois do susto, de abraçar forte meu filho tão amado e corajoso, consegui ouvir as novidades que ele tinha pra me contar. E na aula? Ah, foi tudo muito bem!!!!



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