terça-feira, 2 de junho de 2015

Para onde os sonhos dos filhos nos levam?!


Cresci numa família simples do interior da São Paulo. Monte Mor nunca apareceu em nenhum mapa que estudávamos na escola pública do bairro. Minha mãe, professora primária da escola estadual e meu pai, bancário. Sempre tivemos uma vida normal, dentro dos básicos padrões da década de 80 e 90. Não falávamos muito da situação política da época, mas brincávamos na rua o dia todo. Não tínhamos os brinquedos mais cobiçados, mas também não faziam falta porque andávamos de bicicleta, fazíamos piquenique na calçada dos vizinhos e construíamos barracas no terreno baldio da rua.



Às vezes, o nosso desejo nos finais de semana, era ir para a cidade vizinha passear no shopping e andar de escada rolante. Quem sabe até ganhar um lanchinho no MacDonald`s! E nas férias de verão sempre viajávamos para as praias do Litoral norte e sul de São Paulo, com aquela Belina branca que  mais parecia uma ambulância. Assim crescemos e aprendemos sobre a vida e o mundo que fazíamos parte.





Acho que esta era a vida que meus pais sonhavam em ter: uma casa própria, dois carros na garagem, os filhos com saúde e estudando, um emprego seguro e uma semana de férias na praia todos os anos. Ah, e é claro: uma Lua de mel no Rio de Janeiro, em Nova Friburgo. Essa tinha sido a viagem mais longa e linda da vida daquele casal. Lembro de ouvir minha mãe contando sobre o frio que passaram, que foram de ônibus recém casados e cheios de sonhos para a nova vida em família.

"Mãe, mas esse foi o lugar mais longe que vocês já foram?", perguntávamos indignados sempre que essa conversa surgia. E com o maior orgulho, ela dizia que sim.

Porém, o tempo passa e os filhos começam a traçar seus planos e a desenhar seus próprios sonhos para a vida. 

Eis que eu decidi tentar o vestibular em uma faculdade em Curitiba. Trabalhei, guardei dinheiro o ano todo, estudei e fui. Não, não estava sozinha! Meu pai e minha mãe me levaram de carro para lá. Queriam saber onde eu ficaria, se era seguro deixar a caçula de 18 anos sozinha em um lugar desconhecido. Agora sim, de carona com meus planos, meus pais puderam conhecer uma nova cidade e em outro estado. Mas, por sorte ou destino, não passei no vestibular do Paraná!

E o tempo, que passa desenfreado como enxurrada em dia de tempestade, fez com que novos sonhos e distâncias aparecessem para empurrar essa família simples do interior.


Foi quando eu decidi viver longe daqueles que sempre estiveram tão perto... Só que dessa vez a incerteza tomou conta de mim, sabia que aquele casal caipira não decolaria neste tão grandioso sonho que construí ao lado do meu marido. Pegar um avião? Jamais fariam isso!


Tudo bem que eles logo de cara preparam os documentos e garantiram que viriam aqui nos visitar. Só vendo para crer! Só eles estando aqui para eu poder ter a certeza que enfrentariam esse leão e deixariam aquela aventura, do casal recém casado que foi para o Rio de Janeiro, ser supreendida por essa viagem para os Estados Unidos. 
E para onde os sonhos dos filhos nos levam?! Os meus sonhos carregaram meus pais e minha irmã para minha nova morada aqui no norte da América. Eles chegaram na quinta-feira mais ensolarada da primavera e fizeram dos meus dias frios os mais quentinhos e felizes que tive aqui.





Sabe quando tudo parece mentira? Sabe quando tudo encanta e faz os olhos brilharem de tanta beleza? Sabe quando o tempo para e suspende as horas? Aquele tempo que corre apressado deu-nos o presente de viver cada dia (dos 10 que nos foram reservados) com toda intensidade, amor e gratidão.

E como sou grata! Grata por não terem nos dado tudo que queríamos, por terem nos mostrado o quanto era preciso trabalhar duro para ter aquilo que eles haviam conquistado. Imensamente grata por terem sonhado com uma vida simples, segura e feliz quando viajaram recém casados para Nova Friburgo. Agradecida por terem ido ainda mais longe, de carona em meus sonhos, e por vencerem esse grande desafio pelo simples desejo de nos rever e saber se estamos seguros neste lugar desconhecido. 

De verdade, sabe o que eu quero? Quero que os sonhos continuem nos surpreendendo por toda vida. Que eu possa continuar carregando meus pais de carona comigo enquanto estivermos juntos. E que nossos filhos nos levem para lugares e vivências que ultrapassam a nossa pequena e simples capacidade de sonhar. Que caibamos em seus planos futuros nem que seja apenas para conferir se estão felizes e seguros em suas escolhas.




Quando olhamos de perto (por Aline Pinheiro)

Boston / Primavera 2015

Public Garden

Larz Andersen Park

Arnold Arboretum 




Public Garden

Fotografia de Aline Pinheiro
alinepinheiro17@gmail.com

terça-feira, 19 de maio de 2015

Quando decidimos viver longe


Desde que nos conhecemos ele já havia escolhido viver longe. Saiu de casa e ficou distante da sua família mesmo sendo o único filho que aquele casal decidiu ter. Arrumou as malas para trabalhar num lugar que lhe daria melhores condições para ser aquilo que gostaria de ser. Ele não imaginava que, no meio desse novo caminho, encontraria alguém no elevador do seu prédio que mudaria todos seus planos.

Eu nunca havia escolhido viver longe... Consegui fazer uma faculdade que ficava apenas 40 minutos da casa onde nasci e cresci, onde sempre que quisesse podia voltar para sentir o quentinho do abraço dos meus pais.  

Mas desde o dia que encontrei aquela pessoa no elevador do meu prédio, os planos da "minha vidinha" de menina do interior mudaram muito.

Ele sempre soube se despedir e foram tantas as despedidas. Ele sempre carregou tanta coragem na bagagem, vai longe e volta. Encontra, aproveita cada minuto, despede-se e sente saudades. Ele sempre viveu sentindo saudades. E eu? Nem imaginava o que era isso. 

Até que um dia decidimos viver longe da nossa família. Para ele seria aumentar a distância, para mim, seria ficar longe de verdade. Não me lembro qual foi exatamente o dia em que tomamos essa decisão, mas tenho quase certeza de que foi naquele encontro no elevador.

Arrumamos as malas com muita esperança de viver uma vida melhor, de conquistar novos desafios e alcançar nossos objetivos. Tentei tirar um pouco da coragem da bagagem que ele já havia arrumado e coloquei disfarçadamente nas minhas coisas. Distribui um pouco dela na mala das crianças, assim todos estariam fortes para seguir em frente nesta nova fase longe daqueles que sempre estiveram tão perto.

Quando decidimos viver longe assumimos o compromisso de sermos felizes e que cada conquista precisa compensar a falta absurda que sentimos da nossa família. Quando resolvemos ficar distantes, assinamos o contrato de fortalecermos uns aos outros, de unir nossas forças e dessa forma, vamos preenchendo nossa bagagem de mais coragem. 

Eu demorei 32 anos para fazer isso e confesso que sou a mais novata no quesito "lidar com a saudade e com a distância". Ele e as crianças estão melhores que eu, não tenho dúvida! 

E sabe o que acho mais importante nisso tudo? É que viver longe não significa que "sofremos" de falta de amor ou de desapego às nossas famílias. Quando moramos distantes da família nós aprendemos a amar de verdade! A amar sem pedir nada em troca, a dar o devido valor, a reconhecer cada coisinha que eles fizeram (e fazem ainda) por nós. Cada segundo juntos é precioso. Cada abraço ou beijo de boa noite é sentido de todo coração.

Quando decidimos viver longe o tempo passa contado, dia a dia, minuto a minuto. "Quando vamos nos ver outra vez?". Estamos sempre nos preparando para o reencontro e para outra despedida. E disso se faz a vida!

Desejo que meus filhos aprendam que viver longe é estar ainda mais perto de amar de verdade. Pagamos um preço alto por essa distância, por isso temos a obrigação de viver bem e felizes. E que  meus filhos saibam que cada reencontro é único e merece ser vivido com todo coração.


Para meu marido Luiz, 
com quem aprendo a ter coragem
de viver longe!

Para minha família,
por quem morro de 
saudades!


terça-feira, 28 de abril de 2015

E aí você entende a primavera!


Quando passamos grande parte da nossa vida num país como o Brasil, sentimos com certa "leveza" a passagem das estações do ano. A rotina de cada um segue seu fluxo e na maioria das vezes, da mesma forma no verão, no outono, inverno ou primavera. As estações mudam e apenas falamos sobre a chuva, o tempo mais seco, a falta de água em São Paulo, o calor insuportável... muitas vezes passamos pelo outono e mal lembramos exatamente o dia que ele começa.

Durante muitos anos, na minha vida escolar como aluna de uma escola pública de Monte Mor, comemorávamos a chegada da primavera. Pintávamos desenhos mimeografados, com aquele cheirinho de álcool, por horas e horas. Fazíamos flores de papel crepom, cantávamos canções festivas pela estação, mas... o que era aquilo? Por que comemorávamos a primavera? Eu sempre via flores pelo caminho da escola e na minha casa o ano inteiro! Que diacho de festa é essa para a primavera?! Viva a primavera? Não dava para entender! Eu achava que deveria ser "Viva o verão" porque estamos de férias e vamos passear na praia. Mas... primavera?! Aquilo nunca fez sentido para mim.

Nunca... até chegar ESSA primavera!


Depois de três longos-intensos-gelados e "engordativos" meses de inverno, eu, finalmente, entendi o que é de fato a PRIMAVERA! Entendi porque as culturas que vivem em lugares de estações bem definidas comemoram com festas e celebrações a chegada dos dias mais lindos do ano. Entendi o sentido de cada florzinha que brota de um chão que parecia estar sufocado de tanta neve. Compreendi a alegria das canções entoando a vida e o renascimento de todos os seres da natureza.

Somos sobreviventes do inverno! E quando avistamos apontar um broto verde no chão é como se fossemos resgatados para a vida outra vez!


Aquela temperatura positiva é motivo de muita alegria, tiramos as roupas de verão do fundo do armário e arriscamos uma blusa sem manga só pra sentir a sensação deliciosa de liberdade. (Se eu pudesse queimava meu casaco de neve!). Andar de tênis, encher os pneus das bicicletas, buscar o João na escola à pé, abrir a porta do quintal, andar de chinelo em casa, comprar uma churrasqueira, desligar o aquecimento, abrir o vidro do carro, OUVIR O CANTO DOS PASSARINHOS QUE VOLTARAM! Coisas tão pequenas que passavam escondidas por mim, agora valem ouro e dou o imenso valor que elas merecem.




Esse ano eu completei a minha primeira primavera nesses meus 33 anos de vida. Agora eu entendo porque as pessoas dizem quando alguém faz aniversário "Parabéns, mais uma primavera!", porque primavera é renascimento de verdade: da natureza, da alegria e da esperança. A vida se renova! É motivo de sobra para celebrar o novo que ressurge do improvável!


Mas é só depois de um inverno rigoroso que você entende a PRIMAVERA!

Welcome Spring! Pode entrar e invadir a nossa casa de flores, cores, cheiros e sabores!!!




sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Uma vida no frio (Parte 2) - porque frio mesmo é em fevereiro!


Você imaginava que aquilo que fazia em dezembro era frio?! Eu também achava! Frio, frio mesmo e de verdade, com tudo tapado de neve acontece em fevereiro! É nessa época que o bicho pega nessas terras geladas do norte do mundo.

Viver num lugar frio como este, faz a gente mudar os hábitos e jeito de ver a vida lá fora. Aqui dentro da nossa cápsula quentinha cultivamos a convivência intensa em família, principalmente nos dias de tempestade de neve, quando não temos para onde ir a não ser ao banheiro ou para os quartos que ficam na parte de cima da casa. 

Vamos começar pelas tempestades de neve. Até elas chegarem não sabíamos muito bem sobre o que se tratava. Começa com os sinais de alerta no aplicativo do tempo no celular. Depois o burburinho pelos grupos de mensagem no whatsapp. De repente, o governador já está na TV pedindo para as pessoas ficarem em suas casas durante os dias em que a Blizzard estivesse pairando pelos ares daqui. Logo em seguida aparece o prefeito anunciando o perigo do fenômeno que estava prestes a deixar a cidade embaixo de muita neve. Os supermercados começaram a ficar lotados, filas e filas no caixa, frutas e produtos esgotados nas prateleiras. Meu Deus! Quero voltar pro Brasil!!!!!!

Foi assim, nessa tensão que presenciamos nossa primeira tempestade de neve e teve logo que ser uma nevasca histórica! Peraí, calma! A gente não precisa de nada tão especial assim! Pode ser uma nevasquinha qualquer!!! Mas não, fomos presenteados por uma silenciosa blizzard que passou quieta pela nossa casa e nos deu um enorme susto quando olhamos pela janela de manhã. Estávamos enterrados na neve e assim continuamos desde então.

Mas aqui ninguém fica preso em casa, se sentindo num filme de terror, sozinho, sem vizinhos, sem gente na rua! Não, eu já teria infartado! Aqui, durante a tempestade, por toda madrugada, ouvíamos máquinas trabalhando e pessoas que vinham tirar a neve da nossa porta. Havia vida lá fora! Pessoas autorizadas a trabalhar na rua enquanto a tempestade de neve caía.

Depois de dois longos dias presos em casa, a vida voltou a funcionar lá fora: as pessoas desenterraram seus carros, as crianças foram se enfiar naqueles montes de neve... nós também fomos, claro!

Na maior alegria vamos preparar as crianças para sair na neve. Simples?! Não!!!! Quase uma missão impossível! Começamos sempre dando uma ajuda pro mais velho que já consegue colocar seu equipamento sozinho: por cima da roupa que está em casa, ele coloca um agasalho de moletom, uma calça de neve por cima da calça de abrigo. Casaco. Luvas. Gorro. Bota. Pronto! Agora fica perto da porta tomando um vento pra não morrer de calor. Próximo: o do meio. Tudo igual, mas ele não fica parado. Temos que correr atrás: bota essa blusa, estica esses dedos direito pra encaixar na luva, volta aqui e põe esse gorro pelo amor de Deus! Eu já estou suando, esbaforida e querendo que essa brincadeira na neve acabe antes mesmo de começar! Falta alguém???? Claro, a filha pequena que detesta luva, gorro, casaco... aí começa outra luta! Vira e me dá o braço pra colocar essa roupa! Pare quieta, menina! Não tire a luva que eu acabei de vestir!!!! Ahhhhhhh!

Uma hora depois: todos prontos na porta sem conseguir andar direito. No primeiro passo lá fora a Helena já cai no chão e não consegue levantar de tanta roupa! A neve já toma conta de todo o seu corpinho, mas ela não desanima! O frio parece dar socos na nossa cara. As crianças brincam felizes nos montes de neve e se enfiam naquela coisa branca que bate na barriga deles. Literalmente afundados na neve!

Eu já não aguentava mais o frio! De repente, um choro! Meu Deus! Que foi Lucas?! E o menino urrava no meio daquele monte de neve, onde só víamos sua cabecinha com aquele gorro azul. Achei que um bicho estivesse picando seu pé, mas que bicho estaria ali no meio daquele neve toda?

O pai tirou o menino correndo daquela montanha de neve e quando vimos, percebemos que ele havia perdido uma das suas botas e foi sentir alguma coisa depois de uns minutos (seu pé já deveria estar dormente). Saímos correndo com ele no colo e, dentro de casa, colocamos o pé embaixo da água quente. Mas ele continuava a gritar e dizia que agora era o outro pé. Só que alí tinha uma bota! Fui dar uma espiada e vi que dentro da bota tinha muita neve! Tira tudo e põe o outro pé na torneira também.

Volta todo mundo pra dentro de casa!
Tanto trabalho pra colocar roupa... para 5 minutos de tolerância no frio e na neve!
Depois o pai saiu para procurar onde estava o outro pé da bota!

Com tanta neve acumulada, ficou ainda mais complicado buscar o João da escola a pé e empurrando um carrinho com duas crianças dentro. Infelizmente o sonho de viver sem carro teve que chegar ao fim... e confesso que a vida com carro é um sonho também!!!!! Mas, aqui na terra gelada, quem tem um carro tem muito trabalho a fazer. Quando cai esse monte de neve é preciso sair do quentinho de sua casa para remover todo aquele negócio frio que está em cima, embaixo, do lado... do seu carro. Essa tarefa mais pesada ficou para o marido que é mais forte e tolera muito mais que eu esse frio da desgraça. Após mais uma nevasca - a primeira com o tal carro - o Luiz sai todo animado para "rapar" (termo utilizado pelos brasileiros que trabalham aqui) sua primeira neve. Ele passou um tempão lá fora, aguentando o vento na cara, com a mão dormente de tanto frio e quando estava quase no meio da tal "raspação" de neve do carro, aparece nossa vizinha com uma pá. E para a supresa do meu marido ela diz: "Opa, acho que você se enganou! Esse carro que você está limpando é meu!". E lá se foi então, meu marido, limpar o carro o certo. 

Pois é minha gente, uma vida no frio não é moleza não. É duro duro que nem gelo. E frio. E branco. Parece que esse mês de fevereiro tem uns quarenta e tantos dias... não passa nunca. Quero ver a hora que esse monte de neve derreter... acho que voltaremos de enxurrada para o Brasil!


Esses dias dentro de casa e só cuidando dessa turminha, fez com que eu buscasse outras formas de extrapolar o que passa na minha cabeça. Então, fiz um video com uma música própria para mostrar um pouco da nossa vida no frio.








segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Para ler com as crianças - O jardim



A rã estava em seu jardim. O sapo caminhava ali por perto. “Que lindo jardim você tem, Rã,” ele disse.
“Sim,” falou a rã. “Ter um jardim é ótimo, mas deu muito trabalho.”
“Eu espero, um dia, também ter um jardim”, suspirou o sapo.
“Aqui estão algumas sementes de flores para você começar. Plante-as no chão,” completou a rã, “ e em breve você terá um lindo jardim.”
“Demora muito?” perguntou o sapo.
“Muito breve”, respondeu a rã.


O sapo correu para a casa. Ele plantou as sementes de flores. “Sementes," disse solenemente o sapo, "comecem a crescer agora.”

Ele andou de lá para cá uma porção de vezes. E nada… As sementes ainda não haviam crescido.

O sapo aproximou sua cabeça perto da terra onde estavam as sementes e disse bem alto, “Sementes, comecem a crescer agora!”
O sapo olhou para o chão novamente. As sementes não haviam crescido.

O sapo colocou sua cabeça muito perto da terra e gritou “SEMENTES, COMECEM A CRESCER AGORA!”

A rã veio correndo pelo caminho. “Que barulheira é esta aqui?”, ela perguntou.
“Minhas sementes não querem crescer”, disse o sapo.

“Você está gritando muito,” falou a rã. “E essas pobres sementes estão com medo de crescer.”
‘Minhas sementes estão com medo de crescer?” questionou o sapo.
“Claro,”explicou a rã. “Deixe-as em paz por alguns dias. Deixe o sol brilhar sobre elas, deixe a chuva cair e molhar a terra. Logo suas sementes começarão a crescer.”

Naquela noite o sapo ficou espiando pela janela. “Droga!" esbravejou. “Minhas sementes ainda não começaram a crescer. Elas devem estar com muito medo da escuridão da noite.

O sapo foi para o jardim com algumas velas acesas. “Vou ler uma histórias para vocês, minhas sementes,” falou o sapo. “E então, não terão mais medo algum”.
O sapo leu uma longa história para suas sementes.



E todos os dias o sapo cantava lindas canções para as suas sementes.

E todos os dias o sapo lia diversos poemas para as suas sementes.

E todos os dias o sapo tocava várias melodias para as suas sementes.

O sapo olhou para o chão. As sementes ainda não haviam crescido.

“O que mais eu preciso fazer?” choramingou o sapo. "Essas devem ser as sementes mais teimosas de todo o mundo!”

Então o sapo sentiu uma canseira danada e adormeceu.

“Sapo, sapo, acorde,” disse a rã. “Olhe para o seu jardim!”
O sapo olhou para o jardim. Viu pequenos pontinhos verdes brotando do chão.
“Até que enfim,” gritou o sapo, “minhas sementes pararam com esse medo de crescer!”
“E agora você também tem um lindo jardim,” comemorou a rã.


“Sim,” falou o sapo, “mas sabe rã, você estava certa. Esse jardim me deu muito trabalho.”




LOBEL, Arnold. Frog and Toad together. Barnes & Noble, New York: 2005.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Para ler com as crianças - A lista

Já faz um tempo que eu uso os livros que o João traz da biblioteca da escola para treinar meu inglês. Além de ter mais facilidade para ler e compreender este tipo de livro, também aproveito para conhecer um pouco da literatura infantil do país onde eu vivo agora.
Gosto muito da qualidade do material em si, das ilustrações e, principalmente, das histórias que leio.
Essa semana veio este livro para casa, Frog and Toad Together, de Arnold Lobel. Logo na primeira história já me diverti muito! Eles me lembraram uma dupla de palhaços!
Vi que não temos esse livro traduzido no Brasil, então resolvi compartilhar com vocês a primeira história que abre esse engraçado livro de dois grandes amigos.
Espero que gostem!

 A LISTA




Numa manhã, o sapo sentou em sua cama e disse “Eu tenho muitas coisas para fazer”. Eu vou escrever todas essas coisas em uma lista para poder lembrar depois.”
O sapo anotou em um pedaço de papel: 

LISTA DE COISAS PARA FAZER HOJE

Depois ele escreveu:
ACORDE

“Vamos começar”, disse o sapo e riscou da lista:

ACORDE

Em seguida o sapo anotou outras coisas no pequeno papel



LISTA DE COISAS PARA FAZER

ACORDE
TOME CAFÉ 
VISTA-SE 
VÁ À CASA DA RÃ
PASSEIE COM O FROG
ALMOCE
TIRE UM COCHILO
BRINQUE COM A RÃ
COMA MUITO
VÁ DORMIR

"Pronto, agora meu dia está todo escrito neste papel”, comemorou o sapo muito satisfeito.





Ele levantou da cama e comeu alguma coisa. Em seguida riscou:  

TOME CAFÉ 









O sapo tirou suas roupas do armário e as vestiu. Depois conferiu: 

VISTA-SE 


E então pôs a lista no bolso.




Abriu a porta e caminhou sossegado pela manhã fresca. Logo estava em frente a porta da Rã. Ele tirou a lista do bolso e riscou: 

VÁ À CASA DA RÃ



O sapo bateu na porta:

“Olá”, disse a rã.
“Olha só, essa é a lista das coisas que preciso fazer hoje”, foi logo mostrando seu minúsculo pedaço de papel.
“Oh, isso é muito legal”, comentou a rã.
O sapo disse então, “Minha lista agora me diz que precisamos dar um passeio”.
“Tudo bem, eu estou pronta”, falou a rã.


A rã e o sapo deram um longo passeio. Em seguida, o sapo tirou a lista do bolso outra vez e riscou:

PASSEIE COM A RÃ

Só que por ali passou um vento muito forte que arrancou a lista das mãos do sapo. Aquele pedaço de papel rodopiou e voou alto pelo ar afora.

“Socorro”, gritou o sapo. “Minha lista foi embora com o vento. E agora, o que eu vou fazer sem a minha lista?”

“Venha comigo”, falou a rã. “Nós corremos atrás da lista e a pegamos”.
“Não!” gritou o sapo. “Eu não consigo fazer isso”.
“Por que não?”, perguntou a rã.
“Porque,” gemeu o sapo, “correr atrás da minha lista não é umas das coisas que escrevi na minha lista de coisas pra fazer!


A rã nem esperou e saiu correndo atrás do papel que voava. Ela atravessou colinas e pântanos, mas a lista voou pelos ares e desapareceu nas alturas.

“Me desculpe”, engasgou a rã, “mas eu não consegui pegar sua lista”.
“Bah”, disse o sapo. “Não consigo me lembrar de nenhuma das coisas escritas nela. Agora, eu apenas preciso ficar sentado aqui fazendo nada”, disse o sapo.


Ele sentou e não fez mais nada mesmo. A rã sentou com ele.




Depois de um longo tempo em silêncio a rã falou, “Sapo, está ficando escuro. Nós precisamos ir dormir agora.”
“Vá dormir”, gritou ele. "Isso era a última coisa da minha lista!”
O sapo escreveu no chão com um galho:

VÁ DORMIR

E depois riscou:
VÁ DORMIR

“Agora sim”, disse o sapo  “Meu dia está todo riscado”!
“Eu estou feliz”, comentou a rã.
E daí a rã e o sapo foram dormir.


LOBEL, Arnold. Frog and Toad together. Barnes & Noble, New York: 2005.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

O lugar mais seguro do mundo



Se me perguntarem, digo que sou uma pessoa de coragem. Mas, no fuuuundo, que beira bem o raso do meu ser, sou muito medrosa. Por isso, sempre busco um lugar onde me sinto segura e protegida. E esse lugar é aqui (na linha de baixo).

A noite cai sem pedir licença e no momento que menos queremos que ela apareça. De repente, é a hora de dormir e eu sinto uma vontade que cresce como um gigante de não ir para a minha cama. Pode ser pegar no sono no sofá, no tapete ou sobre a mesa da cozinha enquanto meus pais conversam depois do jantar. Quero ouvir essa voz de fundo nos meus sonhos, ter a certeza de que alguém no mundo está de olho aberto e em alerta caso aconteça qualquer coisa por aqui.

Mas quando vejo, arregalo os olhos, estou no meu quarto escuro, naquela cama gelada, sem uma voz que expresse vida acordada na terra. Saio correndo e, quase sem pensar, entro naquele quarto onde há o lugar mais seguro do mundo: a cama da minha mãe e do meu pai. Entro pela porta de acesso livre, o canto do meu pai, que nem me vê chegar; mas nada passa desapercebido pelo radar dela... "Volte para sua cama!", "Só um pouquinho, mãe, por favor!". A canseira dela não dá brecha para uma discussão e eu fico sentindo o calor das pessoas mais importantes da minha vida. Ali o fantasma não chega, a alma penada não puxa o pé, a febre passa, nada dói, não tem monstro do guarda-roupa, pesadelo e ladrão? Se tiver, eu abraço meus pais e juntos lutamos contra os ladrões. Aqui me sinto um super herói.

E tem lugar pra todo mundo, viu?! Tem outros que aparecem na porta e acabam ficando nos pés ou encolhidinho num canto que sobrou. Mas a gente foi crescendo e, naquela época, não tinha cama king size e o lugar mais protegido do mundo foi ficando cada vez mais complicado de se visitar de madrugada. 

Sempre tive sonhos que me faziam acordar assustada e com medo. Mesmo menina grande, lá ia eu com meu travesseiro e colchão para o lado de minha mãe. Ela me afagava com tanto amor, rezava alguma coisa baixinho pro medo passar, segurava minha mão. "Mãe, não dorme! Eu tô acordada ainda!"; "Não estou dormindo filha, só descansando a vista", dizia ela. "Então abre o olho, mãe!". E aquela luz da velinha acesa no quarto deles embalava meu sono como uma canção de ninar.

Foi esse lugar mais protegido do mundo que me ensinou a ter coragem de mãe. Sempre que me sinto com medo ou insegura com qualquer situação, penso nesse estado de segurança que me acalentava quando era apenas filha. Hoje, quando me assusto com um baixinho na beira da minha cama, dizendo "Mãe, posso dormir ai com você?!", já boto correndo pra perto de mim. Seguro a mão, pergunto qual era o pesadelo, rezo baixinho pro anjo da guarda tirar qualquer coisa ruim dos pensamentos dos meus filhos.

Os pediatras e especialistas podem dizer que isso não está certo, que criança tem que dormir a noite toda na própria cama, aplicam novas técnicas e fazem terapia com os pais. Tudo bem que eu também não sou de todo contra e nem a favor, sou uma mãe ponderada que escuta todas as partes e que age pelo impulso do coração na maioria das vezes. Eu não quero meus três filhos dormindo todos os dias no meio da gente, porque aí eu não durmo mesmo! 

São as minhas lembranças me levam para esse lugar seguro e quentinho, que também foi negado algumas vezes - eu aprendi a amá-lo ainda mais quando era dito não! - e é isso que me faz entender o sentimento dos meus filhos quando nos abraçam agradecidos no meio da madrugada.

E que essa lembrança afetuosa também fique guardada para sempre no pensamento dessas três queridas crianças toda vez que apagarem a luz para dormir. 

"Boa noite, meus filhos, durmam com Deus!", ainda diz a voz da minha mãe de longe, que passa por esse fio invisível que une as almas. Mal sabe ela que essa frase sempre soou para mim assim: dormir com Deus deve ser que nem dormir na cama com vocês.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Como medir um grande ano?


Parece um tanto estranho, mas não sinto aquela velha vibração da chegada do novo ano. Deve ser porque estamos longe e as comemorações familiares perdem um pouco seu sentido quando estamos distantes. Só que não deve ser só isso! Minha virada de ano já foi em julho e eu sei bem o motivo...

Um grande ano começa quando abrimos mãos de coisas velhas (ou nem tanto assim), quando arrumamos o armário, nos desfazemos de móveis que não nos agradam mais, ou quando doamos os sapatos que quase nunca usamos. Um grande ano começa quando renovamos o contrato com a gente mesmo, nos damos uma nova chance e decidimos mudar pra valer.

Meu ano novo começou quando esvaziei aos poucos a minha casa e, com um aperto no peito, vi os olhares dos meus filhos para o berço que ia... para as cadeirinhas de passeio, a cozinha, o fogão... tudo foi embora. Esvaziamos nosso coração de tudo que nos incomodava ou nos deixava triste. A cada coisa que ia, guardávamos uma moeda na caixinha da esperança que conseguiríamos em dobro.

Foi novo pra mim abrir mão do meu trabalho, deixar para trás a sala de aula, os alunos, os colegas e a Escola que eu tanto sonhei em estar. Guardei num baú aberto as minhas inquietações pedagógicas, minhas dúvidas, meus sonhos de mudar a educação do meu país. 

Eu cheguei com o pé direito, livre dos medos que me perseguiam, agarrada na esperança do novo e das oportunidades que viriam ao nosso encontro. E do vazio a gente se construiu outra vez: fizemos incontáveis refeições em caixas de papelão, sentamos no chão por semanas, dormimos em colchão por quase um mês. Ninguém titubeou! Ninguém ficou em dúvida se era mesmo a coisa certa! Éramos nós cinco, juntos! Prontos para começar do zero uma nova vida. Já era um novo ano pra mim...

E chegou o sofá, uma mesa com cadeiras, cama, tv, amigos! Reerguemos nossa casa e começamos a viver uma nova vida. Conhecemos novas pessoas que hoje já chamamos de amigos, novos lugares, outros costumes; aprendemos uma nova língua, outro jeito de entender o clima e de se adaptar a ele.

Pois bem, minha hora da virada já foi há seis meses atrás! 
Mas sempre é bom comemorar, tomar um champagne, brindar e desejar que 2015 seja (continue a ser) o grande ano!

Alguns medem como um grande ano se mudou de emprego ou se teve uma promoção no trabalho, se a poupança engordou, se os rendimentos ultrapassaram a meta, se conseguiu comprar a casa própria, se trocou de carro, se viajou para vários lugares, se conheceu novos restaurantes etc. Outros medem a grandeza do seu ano com outro tipo de balança ou fita métrica, como nós, que não fomos promovidos, que deixamos de andar de carro, que aprendemos a viver com menos coisas, que compramos apenas as roupas da estação, que passamos um tempo grande do dia dentro de casa porque lá fora está quase impossível de ficar, que vimos pela primeira vez a neve, que conhecemos muita gente nova e solidária, que não ficamos doentes desde que chegamos, que experimentamos vinhos e cervejas de várias marcas, que nos aproximamos dos nossos filhos, que estamos aprendendo uma nova língua, que temos um quintal enorme com uma árvore linda!


Diante da nossa forma de ver e viver o mundo, nós tivemos um grande ano! E desejamos que mais pessoas possam ter a mesma oportunidade de revirar a vida do avesso e buscar o novo em velhas formas de ser.

Feliz 2015! Que ele seja honestamente feliz!