terça-feira, 2 de junho de 2015

Para onde os sonhos dos filhos nos levam?!


Cresci numa família simples do interior da São Paulo. Monte Mor nunca apareceu em nenhum mapa que estudávamos na escola pública do bairro. Minha mãe, professora primária da escola estadual e meu pai, bancário. Sempre tivemos uma vida normal, dentro dos básicos padrões da década de 80 e 90. Não falávamos muito da situação política da época, mas brincávamos na rua o dia todo. Não tínhamos os brinquedos mais cobiçados, mas também não faziam falta porque andávamos de bicicleta, fazíamos piquenique na calçada dos vizinhos e construíamos barracas no terreno baldio da rua.



Às vezes, o nosso desejo nos finais de semana, era ir para a cidade vizinha passear no shopping e andar de escada rolante. Quem sabe até ganhar um lanchinho no MacDonald`s! E nas férias de verão sempre viajávamos para as praias do Litoral norte e sul de São Paulo, com aquela Belina branca que  mais parecia uma ambulância. Assim crescemos e aprendemos sobre a vida e o mundo que fazíamos parte.





Acho que esta era a vida que meus pais sonhavam em ter: uma casa própria, dois carros na garagem, os filhos com saúde e estudando, um emprego seguro e uma semana de férias na praia todos os anos. Ah, e é claro: uma Lua de mel no Rio de Janeiro, em Nova Friburgo. Essa tinha sido a viagem mais longa e linda da vida daquele casal. Lembro de ouvir minha mãe contando sobre o frio que passaram, que foram de ônibus recém casados e cheios de sonhos para a nova vida em família.

"Mãe, mas esse foi o lugar mais longe que vocês já foram?", perguntávamos indignados sempre que essa conversa surgia. E com o maior orgulho, ela dizia que sim.

Porém, o tempo passa e os filhos começam a traçar seus planos e a desenhar seus próprios sonhos para a vida. 

Eis que eu decidi tentar o vestibular em uma faculdade em Curitiba. Trabalhei, guardei dinheiro o ano todo, estudei e fui. Não, não estava sozinha! Meu pai e minha mãe me levaram de carro para lá. Queriam saber onde eu ficaria, se era seguro deixar a caçula de 18 anos sozinha em um lugar desconhecido. Agora sim, de carona com meus planos, meus pais puderam conhecer uma nova cidade e em outro estado. Mas, por sorte ou destino, não passei no vestibular do Paraná!

E o tempo, que passa desenfreado como enxurrada em dia de tempestade, fez com que novos sonhos e distâncias aparecessem para empurrar essa família simples do interior.


Foi quando eu decidi viver longe daqueles que sempre estiveram tão perto... Só que dessa vez a incerteza tomou conta de mim, sabia que aquele casal caipira não decolaria neste tão grandioso sonho que construí ao lado do meu marido. Pegar um avião? Jamais fariam isso!


Tudo bem que eles logo de cara preparam os documentos e garantiram que viriam aqui nos visitar. Só vendo para crer! Só eles estando aqui para eu poder ter a certeza que enfrentariam esse leão e deixariam aquela aventura, do casal recém casado que foi para o Rio de Janeiro, ser supreendida por essa viagem para os Estados Unidos. 
E para onde os sonhos dos filhos nos levam?! Os meus sonhos carregaram meus pais e minha irmã para minha nova morada aqui no norte da América. Eles chegaram na quinta-feira mais ensolarada da primavera e fizeram dos meus dias frios os mais quentinhos e felizes que tive aqui.





Sabe quando tudo parece mentira? Sabe quando tudo encanta e faz os olhos brilharem de tanta beleza? Sabe quando o tempo para e suspende as horas? Aquele tempo que corre apressado deu-nos o presente de viver cada dia (dos 10 que nos foram reservados) com toda intensidade, amor e gratidão.

E como sou grata! Grata por não terem nos dado tudo que queríamos, por terem nos mostrado o quanto era preciso trabalhar duro para ter aquilo que eles haviam conquistado. Imensamente grata por terem sonhado com uma vida simples, segura e feliz quando viajaram recém casados para Nova Friburgo. Agradecida por terem ido ainda mais longe, de carona em meus sonhos, e por vencerem esse grande desafio pelo simples desejo de nos rever e saber se estamos seguros neste lugar desconhecido. 

De verdade, sabe o que eu quero? Quero que os sonhos continuem nos surpreendendo por toda vida. Que eu possa continuar carregando meus pais de carona comigo enquanto estivermos juntos. E que nossos filhos nos levem para lugares e vivências que ultrapassam a nossa pequena e simples capacidade de sonhar. Que caibamos em seus planos futuros nem que seja apenas para conferir se estão felizes e seguros em suas escolhas.




Quando olhamos de perto (por Aline Pinheiro)

Boston / Primavera 2015

Public Garden

Larz Andersen Park

Arnold Arboretum 




Public Garden

Fotografia de Aline Pinheiro
alinepinheiro17@gmail.com