quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

O MONSTRO DA LIÇÃO DE CASA

Ele saiu da escola cinco minutos mais cedo. Estava cabisbaixo, preocupado, suado... parecia triste. Perguntei se estava chateado com alguma coisa e ele respondeu “Perdi a explicação da professora sobre a lição de casa.”
 
Era ela, o dia dela: “Lição de casa”. Na turma do 1º ano da escola do meu filho, tem lição de casa apenas uma vez na semana e as crianças têm dois dias para realizá-la. Por isso, expliquei para o João que, se não entendêssemos a lição, ainda teríamos mais um dia para fazê-la.
Ao chegar em casa ele correu para a cama. Disse que estava cansado, que acordou muito cedo e precisava dormir. De repente, falou desesperado que precisava vomitar e que estava passando muito mal. Foi até o vaso e ficou lá, de cabeça baixa simulando muitos barulhos. Ele viu que não me impressionei e parou. Voltou para a cama e nem quis almoçar... Deixei que dormisse um pouco e depois de uma hora de sono acordou.
Aqui em casa temos algumas regras (muitas até), pois com três filhos, o convívio fica quase impossível se não definirmos previamente o que pode e o que não pode ser feito. E por falar em regras, a lição de casa era sobre esse assunto: regras da sua casa. Pensei, “ah, o João tira de letra! Ele é meu maior cumpridor de regras da casa!!!”. Bem, a regra daquele momento era: almoçar e fazer a lição. Só depois tem TV ou brincadeiras.
João acordou, lavou as mãos e foi para a mesa. Comeu quieto. Quando terminou, pediu o suco com os olhos cheios de lágrimas. “Que foi meu filho, você quer chorar?”, respondeu que não. Eu insisti porque sei quando ele segura o choro. Insisti tanto que ele armou o berreiro: “Quero ver TV antes da lição, BUÁÁÁÁÁ!”. A boca dele ficou gigante e o som que saía dela poderia ter sido ouvido no Japão. Era o tamanho da “dor da lição de casa”!
Com um pouco de custo pegou a folha, o lápis e sentou. Expliquei o que precisava ser feito e ele respondeu as regras básicas  e mais significativas: não comer chocolate em dia de escola, guardar os brinquedos depois de brincar e não ver TV o dia todo. “Você quer escrever ou desenhar?”, disse que queria desenhar.
 
“Mãe, eu não sei desenhar isso. Vou escrever. Mãe me ajuda. Eu “tô” cansado. Chocolate? É com S?” Lápis na mão furando a borracha. Deita na mesa. Risca a folha. Apaga. Amassa e apaga outra vez. Choro. “Mãe, eu não quero fazer. Vou vomitar, ahhhh!!!” Corre. Vai para a cama. Chora, grita e rola de um lado para o outro. Corre e se esconde. Pega a folha da lição e some com ela.
 
Não sei exatamente quanto tempo isso tudo durou. Eu estava ali, com a bebê no colo, sem dizer uma palavra. Só olhava e acompanhava cada movimento de rebeldia.  
 
Ele já estava cansado e sentado no sofá. Eu disse: “Filho, faz do seu jeito. Termina isso e chama o vizinho da frente para brincar”. Bastou. Em apenas alguns minutos a lição estava bem feitinha, desenhada e pintada.
Eu não sou contra a lição de casa, pelo contrário, acho necessária. Não acredito que seja um “problema escolar” o que aconteceu com o João e sim, genético. Mas essa é outra história que pode ser contada pela minha sogra!
Agora, do outro lado da minha história, como mãe desse molequinho safado que tem medo da lição, entendo – ou melhor – sinto na pele o que as mães me dizem na escola. Somos mães de dois filhos num só corpinho: na escola são uns e em casa são outros!

2 comentários:

  1. Lívia, adorei os seus textos, você escreve muito melhor do que alguns escritores e articulistas bem famosos. Vá em frente,você leva jeito. A literatura espera pela suas histórias cotidianas, divertidas e inteligentes.
    Parabéns !!!

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    1. Sra Anônima, só você para me escrever isso... Obrigada pela força de sempre, amiga querida!

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