terça-feira, 12 de março de 2013

O CHORO E A FRASE: “MÃE, EU NÃO CONSIGO LER!”

 O papel dos pais nessa fase que, nem sempre, é feliz.

 
                Se você tem acompanhado as histórias desse Blog, deve estar achando que meu filho mais velho só chora. Gostaria de esclarecer que não! Pelo contrário: o João quase nunca chora, quase nunca briga, quase nunca reclama, quase nunca fica bravo. Ele é um menino que costuma guardar dentro do mais profundo espaço do seu coraçãozinho de cinco anos, as coisas que o entristecem. Mas, quando decide colocar pra fora, o sentimento vem acompanhado por um enorme choro, sentido, dolorido. As lágrimas são despejadas pelos seus olhos e eu, como sua mãe, fico imensamente comovida.
                Confesso que ele anda colocando muitos sentimentos para fora ultimamente, fato que me deixa demais de satisfeita. Ainda mais nessa nova fase do 1º ano do Ensino Fundamental, com cadernos, lição de casa, lápis, borracha, atividades... e uma enorme carga de expectativas em relação à leitura e à escrita. Minhas expectativas? Do pai? Não, não acho que seja só nossa! Expectativas do próprio João!
 

                E não tem como não criar grandes expectativas, porque o mundo das palavras o rodeia por onde quer que ele vá! Nos seus livros, jogos do computador, programas de TV, nos brinquedos, nas cartinhas que coleciona, na escola, na porta da geladeira cheia de recados... O apelo para aprender a ler tem chegado bem mais cedo do que em 1989, quando eu entrei na 1ª série do antigo “Ciclo Básico”.
                Voltemos ao choro e a frase. João estava deitado no sofá com seus livros do Clube Penguin – aquele clube virtual do Puffel, da história do primeiro luto de uma criança – e percebi que estava recontando os quadrinhos com as frases que lembrava. Perguntei: “Filho, por que você não tenta ler o que está escrito nos balões?”. Santo de casa não faz milagre ou em casa de ferreiro o espeto é de pau. Eu tinha que falar isso? Não! Na cabeça tranquila que o João tem, com certeza estava pensando: eu estou lendo do jeito que sei e estou feliz e satisfeito assim!
                E a mãe continuou: “Olha esse balão, é fácil, vamos lá. Que letra é essa? Com mais essa?”. O pobre filho que adora agradar a mãe (e todas as outras pessoas do mundo) tentou juntar as letras, procurava o som na sua memória e se esforçou. Só que ele já sabia o texto, então, dizia a frase que estava na sua memória. A mãe insistia: “Ah, vamos tentar!”.
                A insistência burra da senhora mãe só poderia acabar em choro. “Ahhhhh! Eu não consigo ler! Sempre que eu tento acabo falando a palavra errada, que não existe. Eu não consigo leeeeerrrr!”. Lágrimas e mais lágrimas! Tá vendo Lívia, pra quê fazer o menino chorar?! Se meu avô estivesse vivo com certeza me diria isso... “Mãe, eu pego livro na biblioteca e não consigo ler. Quando eu vou tentar ler, faço tudo errado!”. Bem, chegou a hora de reparar meu erro.
 

                Deixei que colocasse pra fora todo aquele sofrimento entalado na garganta, coloquei a bebê no carrinho para poder pegá-lo no colo e enchê-lo de carinho. Disse para o meu filho que outras tantas crianças também estão na mesma situação, aprendendo a ler. Ninguém nasce com esse mérito (ainda)... Ele pensa que não sabe e, talvez/com certeza eu o tenha feito se sentir assim. Mas o João já conhece muita coisa sobre as palavras, como lê-las e escrevê-las. Vou mostrar como!
                Fomos para o computador. Eu queria espiar meus e-mails e surgiu a ideia: “Vou escrever umas coisas e você precisa descobrir o que é. São objetos daqui da salinha de estudos”. João ficou animado. Escrevi LIVRO. Ele não olhava para a tela e sim, para a salinha e chutava um monte de coisas: CD, telefone, DVD... “Filho, tenta olhar para a palavra e veja se ela te ajuda a descobrir!”. Olho na tela, olho na sala e chutes e mais chutes. “João, olha pra letra que começa, não te lembra o nome de alguém?”. “LI LI LI”, olho na sala... “Livro!”. Muito bem, ponto na palavra livro.

 
                Nas três primeiras palavras ele se deteve em apenas adivinhar o objeto olhando para as coisas da salinha de estudos. Eu insisti que olhasse para a tela do computador e tentasse buscar algumas pistas nas palavras. MESA. “Olha pra palavra!”, eu já estava perdendo a paciência e a bebezinha também, até começou a chorar. “M... E... Me. Sssss A. Messssa?!?” Dúvida... “Mãe, mesa! Mas isso não é mesa mãe, isso é escrivaninha!”
                Quando leu a palavra MESA, o João se apoiou nas letras e aos sons que ele sabe. Repetiu a palavra que ficou estranha, pois o S para ele não tem som de Z; mas sabia que esse objeto estava na salinha (contexto da nossa brincadeira), e acertou. Ganhou outro ponto! Com a palavra TESOURA foi a mesma coisa: com os olhos mais voltados para as palavras do que para os objetos da sala, ele leu: “T... TE... SSO...U.... RRa tessourra? O que é isso? Tessourra... tesoura, mãe!” Muito bem!!! O choro havia ficado para trás e o sucesso dos pontos era motivo da sua alegria e empolgação.
 

                “Sua vez, João! Vou dar mama e você escreve para eu tentar descobrir!”. “Ah mãe, não tem graça... Você já sabe ler!”. Mas eu já disse que meu filho mais velho gosta de agradar as pessoas, então ele fez uma lista de nomes... ou melhor, mais ou menos uma lista de nomes!
OVO, ASTIAGO, JOÃO VITOR, NEMO, MAFI
 

                Ele tentou garantir seu sucesso, lógico! Escreveu primeiro uma palavra que já conhece muito bem, ganhei um ponto. Depois o nome do amigo Santiago, o próprio nome, o nome do livro que ele trouxe da biblioteca e, na última palavra, fiquei confusa. E agora? Se eu acertar, não teve graça nenhuma a brincadeira, e se e u errar, iria parecer que ele não soube escrever certo. E aí? Só que eu não sabia! Mafi??? Mafi... mafi... E me veio na cabeça Muffin, muffin de chocolate? “Isso mãe, acertou! Eu vi essa comida no desenho da Pink dinque doo!”.
                Eu nem sei direito o que é isso, quanto mais, como se escreve. Só que o João se arriscou! Aprender a ler e escrever é se arriscar. É preciso arriscar, errar, ajustar, tentar outra vez.
 

    E o mundo? Ah, esse mundo... está pequeno demais para as nossas crianças. Ouvi-los dizer “te amo do tamanho do mundo” já significa que o amor não é mais tão grande assim.

 

2 comentários:

  1. Que história linda!!!
    Erros e acertos, é sempre assim!
    Parabéns pela família maravilhosa, e por realmente educar seus filhos (tem muita gente hoje em dia que só se preocupa em criá-los!).
    Adoro seu blog, Lívia!
    Beijos!
    Roberta Andrietta Piva

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    1. Obrigada Ro e que bom que está gostando do Blog.
      Realmente, educar os filhos é uma missão bem difícil. Estamos o tempo todo "errando e acertando". É a vida!
      Um grande beijo.
      Obrigada pelo comentário

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